Estou quase com meus quarenta e seis anos, e por poucas vezes nesta vida, felizmente, sofri abordagens policiais,
e infelizmente, em todas as abordagens sofridas, senti grande constrangimento e medo,
ferido em minha liberdade e direitos de ir e vir, de certo modo, abusado, por mãos desconhecidas tocarem meu corpo, falas ríspidas e comunicação violenta.
(Me sinto invadido com proximidade e toque de pessoas que não conheço, ou não tenha maior afinidade e não foi desenvolvida relação de confiança)
Sei que são, em alguns casos, medidas necessárias, que visam a proteção e prevenção em respeito à segurança,
minha e de meus semelhantes, embora, diante destes longos anos de existência,
tenha visto por parte de polícias, principalmente militares, práticas abusivas, desrespeitosas e desumanas.
Quando criança, presenciei, em frente ao bar que minha mãe tinha, policiais chegarem e baterem sem necessidade em pessoas, ditas suspeitas,
mesmo estas estando sob efeito de álcool (bêbadas), não tendo estas, apresentado resistência,
sendo abordadas com vocabulário chulo e de baixo calão, grosseiro e uma comunicação violenta,
que ao meu entender, gera mais medo que respeito.
As polícias devem agir com condutas que conquistem nosso respeito e admiração, e nos traga segurança, e jamais o oposto.
Crescemos vendo policiais em serviço fugindo à sua missão, e realizando seu trabalho na base do achismo, de especulações, de suposições,
montados em seus preconceitos e atos discriminatórios,
num visível abuso de poder/autoridade, visto que, em serviço (ou fora deste), deveriam tratar de modo educado e cortês aos cidadãos e cidadãs.
Sendo de cor parda, pobre e gay, me vejo, a qualquer momento, correndo riscos de agressões e violências, comprovadas por estatísticas,
e em muitos momentos, nos deparamos com policiais despreparados quando solicitamos socorro, sendo reforçados a sensação de insegurança, não validade, injustiça e negligência, baseados em preconceito, discriminação e ignorância.
Muitos, ainda, usam de brechas nas leis, para continuarem agindo com autoritarismo, abuso de poder, ferindo direitos constitucionais e previstos em lei,
tratando a todos os abordados como que, em suas “suspeitas”, fossem criminosos em potencial, meliantes, quando na verdade, são civis/cidadãos gozando de seu pleno direito de ser, estar, ir e vir, e vir a ser no mundo.
Até que se prove o contrário, ou seja pego em flagrante delito, ninguém pode ser acusado ou posto como criminoso, ou furtivo às leis e normas vigentes, e violência, salvo em defesa ou auto defesa, não deve ser aplicada em hipótese alguma.
Muitos dizem que quem tem medo de polícia é ladrão, como que, dentro das polícias não houvessem aqueles que fogem às regras impostas pelas leis e pelo Estado,
ao que se aplica ao exercício destes, sendo coniventes e por vezes, agentes de atos criminosos, violentos, cruéis e bárbaros, como vemos ora ou outra nas mídias sociais e televisivas.
Nota-se, ainda, pessoas sendo incriminadas por policiais corruptos, a título de vingança, a mando de criminosos, pelos quais são pagos, dentre outros,
o que afirmo, por não ser teoria da conspiração ou verdades infundadas,
sendo a população negra e pobre, gays, travestis, mulheres, etc., os mais perseguidos, abordados, detidos e presos,
e que sofrem os mais diversos tipos de violência, tanto físicas, quanto psicológicas.
E não me vem falar que é mimimi, pois não é!
Nos últimos tempos, temos visto, inclusive, polícias políticas e ou partidárias, compactuando com vieses de cunho religiosos, políticos e ideologias extremistas/fundamentalistas,
que se aproveitam deste aparente respeito que possuem, para seguirem em frente com abuso de autoridade e imposição severa e violenta dos poderes que lhes são atribuídos,
o que foge ao que se considera humanamente digno e dentro das leis.
Duas abordagens policiais me marcaram muito, uma, a alguns anos, em pleno centro da cidade, à luz do dia, em um domingo, que terminou com crises de ansiedade e de pânico, e hoje, não foi diferente.
No passado, eu e um amigo saímos de moto, eu, pilotando, devidamente habilitado, calçados e roupas adequados, capacete e dentro das normas de trânsito.
Nosso salário tinha caído no banco, e como antigamente não tinha as tecnologias de hoje, precisávamos sacar dinheiro para continuarmos nosso passeio, e até aí, tudo bem, um dia aparentemente feliz.
Estacionamos em frente ao banco, não tinha estacionamento separado para motos, tipo temos hoje, e como ia ser um saque rápido, eu disse que ficaria aguardando de fora,
descemos da moto, retiramos o capacete, eu fiquei próximo a parede, enquanto ele seguiu para fazer o saque,
e mal ele entrou no banco, duas viaturas da polícia militar chegaram em alta velocidade, parando uma, fazendo barreira à frente, e a outra, atrás de mim,
aos gritos/ comando de “encosta no muro”, “mãos para o alto”, “encostado na parede”, e foram fazendo revistas em mim, com movimentos bruscos, enquanto gritavam, “quem é você?”, “o que você faz?”, “trabalha onde”, “o que está fazendo aqui?”,
mal dando tempo para responder, somente depois, pediram meus documentos, e assustado, ao sair do banco sem saber o que estava acontecendo, meu amigo vem na direção e também foi colocado em mesma posição.
Fomos abordados desta forma, a qual, sem uma justificativa plausível, questionados, disseram grosseiramente, que não tinham que dar satisfação pela abordagem, que era algo de rotina, práxis,
e somente depois, eles disseram que a motivação da abordagem, tinha sido uma denúncia anônima de que o banco estava sendo assaltado.
Pessoas parando na rua, todo mundo olhando pra gente como que fôssemos criminosos, foi algo que estragou, não somente meu dia, mas toda uma semana, com pensamentos ruminantes daquela cena traumática que mais parecia um filme de terror, que de ação.
Outra abordagem, sendo uma terceira, visto que tinha comentado que eram duas, depois que me lembrei, desta,
íamos, meu parceiro e eu, para casa, de moto, tínhamos acabado de fazer compras, morávamos no sítio,
a vinte e oito quilômetros do centro da cidade, e do nada, vem em nossa direção em sentido contrário, sirenes ligadas,
uma viatura da polícia, não me lembro qual no momento, nos fechando, e nos parando, também, com mesma “valentia”, mesmo não apresentando, de nossa parte, qualquer resistência.
Desça da moto, mãos para o alto, e fomos indagados de onde vínhamos, para onde íamos, o que tínhamos nas mochilas, e pediram a documentação,
tivemos que tirar toda a compra das sacolas, e só depois, fomos liberados, levando alguns minutos para nos recompor e seguirmos rumo à nossa casa, isso, já a pouco menos de quinhentos metros de chegar.
Atualmente, moramos na cidade, no bairro Jardim Sul, e todos os dias, fazemos o trajeto de casa ao serviço, local de trabalho de meu parceiro,
isto, entre três e quatro da manhã, dependendo do dia, de segunda a sábado,
costumo ir em velocidade entre as permitidas nas avenidas, e até então, nunca tínhamos sido abordados por policiais, vindo a acontecer hoje pela manhã, e novamente, uma situação de certo modo, traumática.
Subíamos a avenida da prefeitura, vidros parcialmente fechados, visto que era madrugada, por volta de três e meia a três e quarenta, quando estávamos para virar à avenida Faria Pereira, descia uma viatura da policia militar,
dei seta normalmente, entrando na avenida, a poucos quarteirões da padaria onde meu parceiro trabalha, e ao olhar pelo retrovisor, vi que a viatura virou, vindo em mesmo sentido,
mantive a velocidade, média de quarenta quilômetros por hora, ou menos, e quase em frente à padaria, reduzindo para virar a esquina, onde fica o portão de entrada, de serviços, ao fundo,
eles acionam a sirene da viatura, meu parceiro ainda disse, já vira, e já para em frente ao portão, e eu ainda falei com ele, que era melhor parar em frente à padaria mesmo,
sinalizei, e parei, e eles pararam logo atrás, e abriram, ambos, quase que em mesmo tempo as portas da viatura, se posicionaram e deram voz de comando, dizendo para descermos do carro com as mãos para o alto,
assim sem oferecer resistência, o fizemos, assustados, vendo aquelas armas apontadas para o nosso rosto, e eles gritando, anda, anda, encostem na parede com as mãos para o alto e à vista,
ao tentar argumentar, que não oferecíamos resistência e que estava levando o meu parceiro para o trabalho,
o policial disse com rispidez, se eu queria ensinar o mesmo como trabalhar, reforçando grosseiramente que encostássemos na parede com as mãos para o alto,
e enquanto a policial mantinha a arma em punho, em nossa direção, ele fazia perguntas sem parar, nos revistava, o tal "baculejo", o que nos deixou agitados,
Perguntas, tipo, onde vocês moram, o que fazem a essa hora na rua, vocês tem passagem pela polícia, já foram presos antes, já estiveram na prisão,
e ao virar para falar, ele continuava dizendo, responda com o rosto virado para a parede, e com as mãos para cima.
Pediu meus documentos e em posse dos mesmos, entrou em contato com a delegacia/central, não sei como que fala ao certo, e passava meus dados, e pedindo para conferirem,
e sem permissão, a policial foi abrindo as portas do carro (neste momento, como estava com o celular em mãos, com receio, comecei a gravar a ação),
perguntando se tinha drogas, ou armas, ou algo suspeito dentro do carro, e afirmamos que não, que estávamos em frente ao trabalho de meu parceiro, como fazemos todas as manhãs,
ela seguiu abrindo portas, porta luvas, porta malas, olhando debaixo dos tapetes do carro.
A esta hora estávamos super aflitos, mesmo não tendo feito nada de errado,
meu parceiro não estava com os documentos, e não conseguiam achar na central, os dados que ele fornecia, e o policial nos olhava com ar de suspeita, enquanto pergunta a ele porque não portava os documentos, mesmo não sendo uma obrigatoriedade/crime não portar os documentos,
pediram o nome da mãe dele, depois ele passou os números do CPF, e analisado os nomes, dados do carro, nada vendo de questionável/irregular, foram nos deixando mais a vontade, relaxados da posição.
Ao terminarem a ação, educadamente, dizemos entender o trabalho dos mesmos, só que não achamos que tinha necessidade a postura, e abordagem como foi, a qual entendemos um pouco agressiva/pesada,
para quem não ofereceu resistência alguma, desde que acionaram a sirene,
a policial levantou a voz, dizendo que é o trabalho deles, e que, tem que fazer o procedimento, pois, não sabem quem está dentro do carro, se “maus ou bons elementos”, e por termos feito tal questionamento, entrando no carro, o policial, disse que me daria uma advertência,
por eu não ter dado a seta, ao entrar na avenida em que fomos abordados, o que é uma inverdade, pois dou seta normalmente, não importando o horário e sem tenha ou não carro vindo atrás,
e por eu estar dirigindo de chinelos, coisa que não foi verificada antes de descermos do veículo, e a policial saiu esbravejando, que quem essa gente pensa que é, ou algo assim, essa gente fala demais.
Saíram com ela dirigindo, e dava para ouvir ela falando que essa gente reclama demais.
Viramos a esquina, meu parceiro desceu para trabalhar, eu retornei para casa, e não consegui dormir novamente,
em estado depressivo desde inicio de outubro do ano passado e com Transtorno de Ansiedade Generalizada,
passar por este momento, foi algo marcante e traumático, visto que, a meses, tenho conseguido sair somente para ambientes conhecidos e com pessoas com quem me sinto seguro.
Com certeza, levar meu parceiro todas as manhãs para o trabalho, de agora em diante, não será uma tarefa muito tranquila, dada a situação de possível recorrência de tais abordagens policiais, que aleatoriamente, o fazem,
ao ver um “carro preto suspeito se locomovendo com os vidros baixados de madrugada”,
e por isso, "paramos vocês", sendo o que o policial disse, quando o questionei por qual motivo estávamos sendo abordados, pois consta a lei, que é preciso “fundada suspeita” que deve ser real, e explicada ao cidadão antes de tudo.
Sou leigo no assunto, talvez a abordagem esteja correta, prevista na legislação vigente, e como leigo, tenho muitas dúvidas e entre elas, sugestões,
como que, diante de tais abordagens, onde não se apresenta nenhum ato ilícito, pregresso, anterior à abordagem,
a princípio, e não sendo ofertado nenhuma resistência, fossem tomadas medidas mais leves e humanas/humanizadas,
com uma linguagem mais formal e menos agressiva, pois é certo que, de ambos os lados, o dos abordantes e o dos abordados, há certo insegurança, receio, e apreensivos, do que pode vir a ocorrer,
e que deve-se pensar adiante, com outros pontos de vista, além de que, irão encontrar criminosos em potencial, bem como, poderão encontrar pessoas em estado de vulnerabilidade, que, em abordagens mais firmes,
podem ser entendidas de um modo negativo, não saudável, e causar situações inusitadas, como uma crise de pânico e ou,
se portarem de modo incomum dando margens a interpretações errôneas, de resistência e provocar assim incidentes,
que uma boa e amigável conversa, poderia solucionar, sem criação de possível tumulto ou conflitos.
Digo no caso de idosos, crianças, pessoas com comorbidades, transtornos mentais, transtornos de personalidade, síndromes e outros.
Espero não ser mal interpretado em minhas colocações, só quero o bem para mim, meus semelhantes, em ambientes/espaços públicos, e abordagens, onde nos sintamos acolhidos, seguros, respeitados.
Por Adalmir Oliveira Campos
Nenhum comentário:
Postar um comentário